Chegou a nação Kriola de Dino d’Santiago

04-04-2020

A crioulização do mundo é um movimento imparável nas sociedades contemporâneas, transportando consigo conflitos, cultura, criatividade, herança e festa. Lisboa reflecte-o. Dino d' Santiago assume tudo isso em 'KRIOLA', o seu novo álbum, depois do retumbante sucesso do anterior 'Mundu Nôbu'. Mais uma vez, temos música consciente da sua variedade de raízes, sejam elas cabo-verdianas ou portuguesas, mas de apelo global, activando tanto a preservação de géneros tradicionais como criando novos híbridos modernizados, com o crioulo e a língua portuguesa participando na mesma corrente.

Convenhamos, Dino transformou-se num dos artistas de maior impacto em território português nos dois últimos anos. Um verdadeiro embaixador. De Portugal. De Cabo-Verde. De um mundo novo que nasce das mestiçagens culturais. Dino D'Santiago tem uma personalidade onde se vislumbram dois vectores: o cantor de grandes recursos, capaz de incendiar multidões, como se viu do norte a sul de Portugal, e também por essa Europa fora, e também o ser humano com acento no lado humano.

E eis que agora chega 'KRIOLA', álbum criado entre Londres e Lisboa, com canções de voz envolvente, filtros electrónicos e ritmos como o batuque ou o funaná, tanto exteriorizando emoções de celebração da vida, como de recolhimento, em momentos mais virados para o interior. Revelando palpitações de Santiago, em Cabo Verde, de Lisboa, de Londres, Lagos, na Nigéria, ou de Luanda. "A cachupa instrumental", como diz Dino, "desta vez viajou do batuku ao ozonto, da coladera ao grime, sempre com o tempero final dado pelo funaná que descansa no arriscar de um tarraxo." É isso. É uma obra com muitas fronteiras, mas sem limites, naquele que é o seu álbum mais completo em termos sonoros mas não só. Já se tinha percebido no anterior trabalho. Ele quer ir além do simples entretenimento. Quer deixar um legado.

O autor do celebrado "Nova Lisboa" assume que 'KRIOLA' é o seu álbum mais activista, onde a Morabeza da linha de Sintra, fixa que o crioulo é a segunda língua mais falada na capital portuguesa e ainda assim, as mães negras continuam a chorar por equidade, enquanto gritam "Nhôs Obi"! Ao mesmo tempo, os jovens de hoje furam os preconceitos, e é na rua que nos provam diariamente que "nu ta mistura, Nôs tudo eh Kriolu!", relembrando-nos o verdadeiro significado da palavra "Crioulo", que é não mais que, o resultado da mistura. "Branco ku Preto, um gerason di Oru", que das Noites Príncipe às sessões Na Surra, transpiram em uníssono, vibrando com um som que só a nós e a todos pertence.

Com 'KRIOLA' voltam também os cúmplices musicais que o acompanham desde o 'Mundu Nôbu'. E a Seiji, Branko, PEDRO, Kalaf Epalanga, Toty Sa'Med, Djodje Almeida, Toni Economides, somou novos encontros com Julinho KSD e Vado MKA. Enfim, como seria de esperar, uma extensa família intercontinental, cujo núcleo, aquilo que tudo conecta é a voz, o espírito e a maneira de estar deste crooner criolo. Algarvio, lisboeta, portuense, português, filho de pais cabo-verdianos e que agora é também a voz de uma Lisboa de mistura que nos devolve a poesia mas também as dificuldades do quotidiano, a sensualidade da rua mas também as celebrações, num álbum onde cabe não só toda a vida de Dino d'Santiago, como de toda a nação KRIOLA.

SME